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Subject: A greve é a arma dos governos


Author:
José Miguel Júdice (Público, 30.11.2007)
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Date Posted: 30/11/07 18:42:11

José Sócrates deve estar contente e ansioso que a greve tenha algum sucesso


Os números são impressionantes. No país que é símbolo da greve como forma de fazer política e como festa cívica de contracultura, em França, uma sondagem feita antes do surto grevista recente deu os seguintes resultados: 63 por cento dos inquiridos acham que quem faz greves pensa nos seus interesses próprios e não no serviço público, 68 por cento não aprovam os motivos da greve (luta para manter regimes especiais de reforma), 71 por cento apoiam nessa matéria o Governo, 71 por cento afirmam que tomarão atitudes de oposição às greves nos transportes. E, como se isto não bastasse, 78 por cento acham que os dias de greve não devem ser pagos aos grevistas, 79 por cento são a favor do fim das greves anunciadas, 85 por cento são a favor de serviços mínimos (na modalidade de permitir assegurar o tráfego entre as 7h e as 10h e entre as 17 e as 20h) e 85 por cento acham que devem organizar-se votações secretas nas empresas para determinar quem é favorável à greve.
A greve convenientemente decidida em Portugal para hoje, uma sexta-feira antes de feriado, não foi antecedida por nenhuma sondagem, que eu saiba. E até admito que uma greve de um dia apenas, num país onde a percentagem de grevistas é comparativamente mais baixa, não tivesse uma resposta tão dura e adversarial. Mas a questão subsiste e exprime-se afinal numa pergunta: faz algum sentido a greve no século XXI?
Já abordei o tema, há meses, quando da greve geral decretada pela CGTP. O título era significativo: "Dizem que é uma espécie de greve geral." Tentei explicar aí que este mito soreliano deixou de fazer sentido e que a greve geral devia antes ser chamada "incómodo geral", sobretudo nas grandes cidades e pelas perturbações dos transportes. A opinião de 85 por cento dos franceses sobre os serviços mínimos que julgam adequados para os transportes públicos não deixa margem para dúvidas.
Mas hoje do que se trata é de questionar a greve como arma dos trabalhadores. Que fique tudo claro e contextualizado. Acho que o direito de greve é um instrumento essencial do Estado de direito. Entendo que a luta pelos interesses categoriais é essencial ao pluralismo e que só os próprios podem definir o que lhes convém... ainda que lhes não convenha. Considero que a sociedade portuguesa está cada vez mais dualista, "sul-americana", e que existem compreensíveis razões de queixa dos mais desfavorecidos por um modelo político-social que lhes é (e infelizmente cada vez será mais) desfavorável. E não tenho ilusões que por trás dos resultados da sondagem acima mencionada estão outros egoísmos categoriais e a insensibilidade social generalizada para com as temas que parecem não afectar se não os outros.
Mas a minha questão faz tanto sentido que o Nouvel Observateur, quando registava o fracasso do movimento grevista e o reforço que trouxe a Sarkozy, e quando recordava que o Carvalho da Silva deles foi apupado pelos seus seguidores por ter sido realista, afirmava que esta greve tinha sido laboriosamente organizada... pelo Governo! Isto é, Sarkozy queria muito esta greve, tentou tudo para que se realizasse, evitou que fosse cancelada. O que deveria fazer pensar os que - miticamente e, como se dizia dos generais, ainda a combaterem a guerra anterior - defendem a greve como forma de luta.
As sociedades actuais são cada vez mais pós-industriais, de serviços e de informação, e estruturadas numa miríade de pequenas empresas, muitas vezes familiares. O exército industrial de reserva, a concentração de massas operárias, as empresas fabris com milhares de trabalhadores foram substituídas. A ideologia de classe média e pequeno-burguesa, a normalização cultural feita pelas televisões, a capilaridade social (o chauffeur de táxi que tem um filho advogado e o médico que tem um filho que serve à mesa num restaurante) destrói os fundamentos da luta de classes como choque cultural, quase religioso.
Nestas sociedades, os métodos de combate político que caracterizavam as sociedades industriais funcionam mal e tendem a ser contraproducentes - o que não significa que não sejam acalentadoras para minorias relevantes, que têm no bloqueio e na paralisia dos outros o sucedâneo e a miragem de um poder. A greve francesa demorou alguns dias a acabar, mesmo depois de os dirigentes terem decretado o seu fim. A sabotagem (essa ainda soreliana) voltou a surgir como elementos de afirmação estratégica. Mas essas minorias activas, que tendem a radicalizar-se cada vez mais, afastam-se assim da mera possibilidade de influenciar o curso dos acontecimentos. A desorganização da classe operária, dos trabalhadores por conta de outrem, a diminuição do prestígio e do poder dos sindicatos tradicionais corresponde ao que se passa com os partidos políticos e não deve ser saudada como algo positivo.
Mas, seja como for, hoje, José Sócrates deve estar contente e ansioso que a greve tenha algum sucesso, paralise um pouco por todo o lado os serviços públicos, incomode toda a gente e que os serviços mínimos não sejam respeitados. Esta é a oposição que lhe convém, que lhe permitirá aparecer como a alternativa polarizada aos radicais de esquerda, que lhe permitirá reforçar a sua imagem de determinação e de rigor. E, sobretudo, que fará desaparecer Luís Filipe Menezes. A menos que este último, cumprindo a sua promessa eleitoral de estar à porta de todas as fá-
bricas que vão fechando e, afinal, pelas mesmas ra-
zões, decida ele também aderir à greve. Mas atenção: em França o próprio Partido Socialista preferiu assobiar para o lado. Advogado

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