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Subject: tempos sombrios (DN)


Author:
Cipriano Justo
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Date Posted: 09:02:13 11/04/03 Tue

Tempos sombrios

Hoje, nenhum democrata pode ficar indiferente e passar ao lado do que está a acontecer no País, fazendo de conta que não lhe diz respeito, que isto é uma disputa episódica ente magistrados e políticos e que lá para o Natal vamos todos cair nos braços uns dos outros, não fosse a quadra propícia a esse género de utopias.

Hoje, o que se está a passar com a gestão milimétrica da divulgação pública de escutas telefónicas a líderes partidários e a figuras políticas e públicas de relevo constitui uma substancial alteração das regras com que estávamos habituados a lidar desde que a democracia foi restaurada em Portugal. A técnica de saturação utilizada na divulgação do mesmo conjunto de notícias sobre o mesmo acontecimento está a configurar o recurso já não a técnicas de boas práticas informativas mas a métodos de condicionamento da opinião pública.

É tal a agitação e a dimensão da incontinência deste processo que hoje não sabemos em que nova realidade informativa vamos acordar no dia seguinte. De tal maneira que se tem a sensação de se viver sob uma espécie de tirania das palavras, tal é a sobrecarga conotativa que lhes é dada pela conjuntura em que são conhecidas.

A complexidade e a densidade simbólica de que estes acontecimentos estão impregnados começam a ser tais que estão a reconfigurar a atenção dos portugueses, desviando-a dos assuntos da agenda governamental para a recentrar no clima e nas armas de disputa entre o poder partidário e o poder judicial. E isso tem inevitavelmente um efeito anestesiante sobre a tomada de consciência quanto ao sistema de prioridades da vida política, nomeadamente sobre efeitos que a acção governativa está a ter na vida dos portugueses. O pão já escasseia, mas o circo, esse, começou a refinar os seus números.

Tendo a sustentá-la a quebra do segredo de justiça e o conhecimento de conversas entre personalidades da vida pública, aquilo que era um processo judicial passou a ter uma dimensão política com a entrada em cena de altos responsáveis partidários e do aparelho do Estado, encontrando-se neste momento o PS e o seu secretário-geral no centro de um processo de descredibilização aos olhos dos portugueses. Reforçando e tornando ainda mais veemente a exigência de que a justiça faça o seu caminho em direcção ao apuramento da verdade e à condenação dos responsáveis pelos crimes de abuso sexual de menores, não devemos, em minha opinião, fugir à discussão da dimensão política que este processo assumiu.

Está em causa uma organização partidária que representa cerca de 40% do eleitorado e que constitui um dos pilares estruturantes da democracia e da vida política dos últimos trinta anos. Há, por isso, que tentar perceber os contornos e inventariar as consequências de uma operação desta envergadura, exigindo-se que se tomem as medidas que lhe ponham definitivamente cobro. De uma vez por todas, o Estado tem de prestar contas pelos atropelos que se estão a fazer à vida democrática.

Por razões óbvias, não me quero pronunciar sobre a forma como a direcção do PS conduziu até agora este processo. Isso é matéria do foro interno do partido e cabe naturalmente aos seus órgãos decidirem sobre os melhores caminhos para o reposicionar na intervenção política. O que já não diz exclusivamente respeito aos órgãos dirigentes do PS e aos seus militantes e simpatizantes é a tentativa deliberada de se querer construir um cordão sanitário à volta deste partido, colocando-o sob quarentena política.

Isso passa a dizer respeito a todos os democratas, estejam eles em que partido estiverem, tenham eles a simpatia partidária que tiverem. Nesta conjuntura política, com a direita instalada no poder e a fazer planos para lá ficar pelo menos mais sete anos, torna-se indispensável à oposição a existência de um PS activo, dinâmico e interventivo. Quaisquer que sejam as suas divergências, o combate ao programa neoconservador deste Governo carece da presença e do empenho de todas as forças de esquerda, sem excepção. Quem quer que tenha apostado na divulgação das escutas telefónicas ao secretário-geral do PS sabia que ia atingir o elo eleitoralmente mais forte da oposição. Sabia que ia fragilizar a formação partidária em melhores condições para se construir uma alternativa a este Governo nas próximas eleições. Adivinhava o clima de inquietação que se ia instalar entre os dirigentes e militantes deste partido. Tinha consciência de que neste ambiente de perplexidade se tornava mais difícil mobilizar a sociedade contra o agravamento em curso das condições de vida.

A estes dias de distância, dizer que comunicação ao País do Presidente da República no passado dia 21 de Outubro foi importante tanto pela sua oportunidade como pelo seu rigor político pode parecer já um lugar-comum, tal foi a onda de unanimidade que ela colheu. Porventura por razões diferentes, a verdade é que os responsáveis de todas as formações políticas se pronunciaram favoravelmente sobre ela. Se a peça é em si mesma importante, porque sinaliza uma situação que tendia a ficar perigosamente sem controlo, a verdade é que ela será tão mais importante se se constituir como um programa para acção relativamente esta matéria.

Quero com isto dizer que a intervenção do Presidente da República, por mais pedagógica que tenha sido, só terá sido efectivamente útil se dela forem extraídas todas as consequências, nomeadamente a identificação, o julgamento e a punição dos responsáveis da violação do segredo de justiça. É essa exigência que os democratas portugueses incansavelmente devem fazer daqui para a frente.

Pela minha parte, e conhecido o quadrante ideológico em que me situo e as reservas que guardo relativamente a muitas das suas políticas, não tenho nenhuma dificuldade em defender que nas actuais circunstâncias todos os democratas devem reservar as razões de ordem táctica para melhor altura e pronunciarem-se inequivocamente contra todas as tentações de fazer cair a cortina de suspeição sobre a democracia e instituições. Neste caso sobre o Partido Socialista.

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Re: tempos sombrios do P.S.Luis Blanch10:51:18 11/04/03 Tue


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