Subject: Re: João Amaral e um referendo à moda da «RC» |
Author:
Fortunato Simões
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Date Posted: 19:55:01 09/16/03 Tue
In reply to:
Renovação Comunista
's message, "Comunicado da Dinamizadora Nacional da Renovação Comunista" on 20:04:58 09/13/03 Sat
O Gil Martins tem toda a razão. É de facto impressionante como é que a dita Renovação Comunista, adiantando-se a formular já uma pergunta para o referendo sobre as questões europeias vem cair nos truques e trafulhices usados pelo PS e PSD em 1998 e que felizmente o Tribunal Constitucional então felizmente chumbou.
Repare-se bem : a dita Dinamizadora Nacional do Movimento da Renovação Comunista vem dizer que «só resta substantivamente para perguntar aos portugueses se
estes entendem (ou não), pesados os prós e os contras,
que o seu país continue a pertencer a uma União livre
de países e de povos, cujos objectivos, competências,
direitos fundamentais e de cidadania, instituições e
vida democrática, finanças, princípios de entrada e de
saída da União, e políticas, são os que irão constar
do futuro tratado constitucional.»
Há cinco anos, a pergunta aprovada pelo PS e pelo PS era a seguinte:
«Concorda com a continuação da participação de Portugal na construção da União Europeia no quadro do Tratado de Amsterdão?»
Não há que enganar : as duas perguntas são do mesmo tipo, só que uma é mais curta e seca e outra é mais farfalhuda e tem mais palha.
Ambas têm em comum induzir os eleitores a pensarem que o que está em causa no referendo é uma decisão sobre Portugal continuar ou não na União Europeia.
Não querendo de nenhuma forma imitar aqueles abutres que no outro dia mandaram para o Expresso o noticia sobre o João Amaral e uma alegada carta de demissão do PCP, creio que tem interesse informativo que os desinformados ou desatentos da DN da RC conheçam o que o João Amaral afirmou em 29 de Julho de 1998 na AR sobre a tal pergunta aprovada pelo PS e PSD e que, repito, é indiscutivelmente do mesmo tipo da que a RC vem agora defender.
Com rigor, coragem e inteligência , disse então João Amaral :
(...)
A par da inconstitucionalidade pela simultaneidade, que viola o princípio de unidade e homogeneidade das matérias sujeitas a referendo, o próprio referendo que é proposto pelo seu conteúdo é uma monstruosidade política e jurídica.
Este referendo é produto directo da má-consciência do PS e PSD, quando impediram em 1992 que fosse sujeito a referendo o Tratado de Maastricht. Este Tratado representou uma alteração qualitativa da Comunidade Europeia, num sentido federalizante, visível particularmente na União Económica e Monetária. Por isso, os portugueses deviam ter tido a possibilidade de o discutir aprofundadamente, e de se pronunciarem sobre ele. Perante as propostas feitas designadamente pelo PCP em sede da revisão constitucional que então foi feita, PS e PSD impediram esse referendo, isto apesar das inúmeras posições públicas que de todos os quadrantes surgiram a ser favor.
Para calarem as críticas, PS e PSD anunciaram que iam permitir referendos versando matéria europeia. Ora, a decisão mais importante, que está em curso de ser tomada em matéria europeia, é a decisão de adesão à moeda única e de aceitação do pacto de estabilidade. Mas, uma decisão como essa PS e PSD não querem permitir que seja referendada. Afastaram a previsão dessa possibilidade na revisão constitucional feita nesta Legislatura, e afastam tal tema completamente da pergunta que apresentam aqui para votação.
Não digam que o euro já está no Tratado de Maastricht, porque não é verdade. O que aí estava era a previsão da sua existência, sujeita a uma dupla decisão: a de o Estado querer aderir e a de a União o aceitar. Por não preencher a segunda condição, a Grécia foi excluída. Por não querer participar, a Suécia não faz parte dos países-euro, apesar de ter ratificado integralmente o Tratado de Maastricht, sem nenhum opting-out quanto à União Económica e Monetária e à moeda única.
Se PS e PSD impedem o referendo versando o euro é porque não o querem ver nem pintado.! Esconjuraram-no na revisão constitucional, como o fazer agora nas perguntas que propõem.
Que querem então PS e PSD perguntar aos portugueses? Imagine-se: na versão do Governo se "Portugal deve continuar a participar na construção da União Europeia que resulta do Tratado de Maastricht?";ou, na versão do PSD, se "concorda com o aprofundamento da integração de Portugal na União Europeia, de acordo com o Tratado de Amesterdão?";ou, na versão PP (de Paulo Portas), se "concorda com a participação de Portugal na construção europeia no quadro do Tratado de Amesterdão?" (tinha a ideia de fazer aqui uma pequena nota sobre os sobressaltos do PP, mas não vale a pena, eles mesmos se encarregaram disso; mas para quem não percebeu aquela piada da Rueff no programa do Herman sobre o Manual do Contorcionista, encontrado na pasta do dr. Paulo Portas, está aqui uma pista...).
Voltando às perguntas. O que nenhum dos proponentes pode iludir é o facto de por essa forma porem a referendo a própria participação de Portugal na Comunidade, que ninguém questiona nem está em debate. Se a resposta fosse não, ( isto é, os portugueses não concordassem com a participação de Portugal na construção europeia) o que sucederia ? Portugal saía da Comunidade ? Consideravam que os portugueses se tinham pronunciado contra a adesão de Portugal ao Tratado de Roma ? Mas o PS e PSD na revisão constitucional proibiram a sujeição a referendo de Tratados já ratificados, por isso, sabem que o referendo não pode ter efeito quanto ao Tratado de Roma. Isto é, fazem uma pergunta manipulada, capciosa, indutora de uma questão que não está em debate, tendo em vista levarem a uma resposta afirmativa, mas, para qualquer eventualidade, ficam escudados numa revisão constitucional que fizeram à medida desta mistificação e que os protege contra qualquer acidente, como seria um não maioritário.
Isto não é sério. E pode ser constitucional uma pergunta como esta? Uma pergunta capciosa, indutora de uma questão que não está em debate?
Mas se dizem que não é bem assim, que a questão é sobre a participação de Portugal na União Europeia, mas reportada ao Tratado de Amsterdão, então aparece um outro problema, para o qual também não têm solução.
De facto, a norma constitucional que admite este tipo de referendos que diz podem ser sujeitas a referendo " questões de relevante interesse nacional que devam ser objecto de convenção internacional".
Pergunta-se: qual é "a questão de relevante interesse nacional que deve ser objecto de convenção internacional " que está nas perguntas gémeas feitas pelo PS,PSD e PP? Qual é a questão concreta ?
Na versão inicial da pergunta do PSD, versão inicial que todos se lembram até porque o Prof. Marcelo fez 17 Conferências de Imprensa e 325 declarações públicas sobre ela, havia três perguntas. Além da pergunta-gémea, havia uma pergunta sobre as questões de segurança e outra sobre o emprego. O risco destas perguntas concretas é evidente. Se o "não" ganhasse, Portugal não podia juridicamente ratificar o Tratado de Amsterdão. Não é tanto pelo risco de isso suceder, mas pelo "mau aspecto" de admitir que isso pudesse suceder que o PSD retira as perguntas - as questões - e fica só pela pergunta-gémea que não contém nenhuma questão que deva ser decidida no Tratado.
Esta pergunta é inconstitucional e deixa este referendo sem qualquer hipótese de eficácia. Se ela tem alguma dimensão de eficácia jurídica, então seria o de questionar o Tratado de Amsterdão no seu conjunto, o que o PS e PSD proibiram na revisão constitucional, e, assim, a pergunta seria inconstitucional também por esta via. Mas, não sendo sobre o Tratado no seu conjunto, quando se procura a questão concreta a decidir no Tratado, ela não existe, e por isso, a pergunta é outra vez inconstitucional.
A pergunta feita questiona o que não está questionado, é capciosa, induz uma resposta, não tem o objecto que a Constituição impõe ( uma questão a ser decidida no Tratado ou, no limite, versa o Tratado no seu conjunto).
A pergunta é inconstitucional e ineficaz. É confusa e manipuladora. É uma farsa.
Isto não é um referendo - e um "referaude"...! »
(...)
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