Author:
antónio nogueira leite
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Date Posted: 16/05/05 11:12:23
O problema das finanças públicas portuguesas e, em particular, o crescimento da despesa pública tem originado, nos últimos cinco anos, imensa prosa, muita opinião, monopolizou a dada altura o debate político, foi obsessão, tornou-se frustração e, finalmente, parece ser novamente preocupação.
Como tão bem tem explicado Medina Carreira, o problema não é de agora, tem, pelo menos, mais de 20 anos, período em que a despesa pública cresceu e rigidificou. A evolução quantitativa do peso do Sector Público Administrativo (SPA) fala por si a despesa corrente do SPA representava 28% do PIB em 1980 e representa hoje quase 43%, isto é, quase 15 p.p. da riqueza criada em cada ano pelos portugueses. Mas ainda mais grave e preocupante é o facto de que as transferências correntes, que já são responsáveis por 60% do aumento da despesa pública corrente, evoluem de acordo com regras que implicam um peso cada vez maior, num contexto em que a evolução demográfica ampliará, a médio prazo, o risco de hipotecarmos irremediavelmente o futuro dos nossos filhos.
Os optimistas encontrarão na história económica portuguesa o lenitivo para a tensão que a nossa irresponsabilidade colectiva coloca sobre os que mantêm alguma réstia de remorso. Como me referia há poucos dias um ilustre catedrático, optimista inveterado, a situação não é nova e, nas suas palavras "A constância do problema é a chave do nosso conforto moral em matéria de despesismo de Estado. Também os nossos pais e avós nasceram com o futuro hipotecado e cá estamos." Revelou-me então a memória de uma aula, dada há precisamente 78 anos por um (então) futuro ministro das Finanças, que vale a pena recordar, pela sua actualidade.
Dizia o então jovem académico que "se se necessita uma forte redução das despesas públicas e não simplesmente comezinhas economias que pouco alcance terão" - não se estava a referir ao Governo do dr. Barroso - "é conveniente saber se entre os grandes ramos por que se distribuem os dinheiros públicos alguns se poderão cortar da árvore estadual, sem prejuízo para a nação, e com uma simplificação benéfica da acção que o Estado propriamente deve desempenhar". Mais acrescentou - e não se tratava da encomenda ao grupo de trabalho do prof. Pinheiro - que "serviços inúteis para a colectividade nacional, ou serviços que, tendo a sua utilidade, a não têm de facto no estado actual do País, e por isso seriam dispensáveis, nem neles falamos, porque nas finanças públicas como nas economias privadas as despesas a que dão lugar, nem se justificam nem se compreendem - queremos dizer, que não existem como despesas, mas com delapidações dos dinheiros públicos". "Referindo-nos às que correspondem a serviços oferecendo interesse público, sabe-se que o critério de distribuição destes serviços e despesas entre o Estado e os participantes não tem sido exclusivamente o critério económico da maior produtividade, mas um critério político. Se há serviços tão inerentes à própria estrutura e essência do Estado que, seja qual for o seu custo, lhe têm de ser confiados, há muitos outros que passados da mão dos particulares para a administração pública não ficam melhores e são muitíssimo mais caros. Uma razão económica - obter a maior soma de utilidades com o menor dispêndio de riqueza - levaria o Estado a desembaraçar--se deles de novo, se tais razões de ordem política não se lhe opuserem tenazmente." Já nesse tempo, há quase 80 anos, se sentia o peso daqueles que então, como agora, se tinham apropriado do que é de todos.
Já na altura era verdade em Portugal que "a multiplicação dos institutos não serve melhor o interesse nacional, o qual mais completamente se satisfaria concentrando os recursos existentes. Um arremedo de serviços que se estabelece aqui e além contenta as pequenas vaidades mas está longe de satisfazer o interesse geral, tirando o melhor rendimento das somas despendidas."
O meu catedrático amigo descansa com a constância do problema. Eu, pelo contrário, penso que hipoteca mesmo o futuro, como aliás hipotecava quando o escriba acima retratado pôs em prática o seu plano. Venceu durante um tempo as causas do problema que agora se repete mas não conseguiu alterar a mentalidade, nem as condições para um desenvolvimento sustentado de Portugal, e, uma vez terminado o efeito da sua acção na esfera da despesa pública, tudo voltou ao que era. Só que os tempos são outros e agora a nossa responsabilidade é maior temos de crescer e não podemos continuar a onerar as novas gerações gastando o que é delas.
Como se percebeu no dia 11 em Belém, há no Governo quem saiba que a esperança implica sacrifício e que a inacção termina em nova e crescente hipoteca. Resta-nos ter esperança
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