Subject: Re: o primado do económico? |
Author:
João Aguiar
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Date Posted: 14/12/04 1:25
In reply to:
paulo fidalgo
's message, "o primado do económico?" on 14/12/04 0:14
Vou responder ponto por ponto caro Paulo Fidalgo.
1- sobre este não há nada a dizer.
2- eu não concordo nada com essa postura utopista de achar que a democracia é algo de exterior ao capitalismo. A democracia é uma forma de Estado, repito forma de Estado. A questão não é escolher entre a democracia e o capitalismo mas entre o capitalismo e o comunismo. Sei que o que vou dizer pode ser chocante mas aqui vai. Os comunistas, em última instância, não são pela democracia. Para evitar mal-entendidos, devo dizer que, evidentemente, uma forma de estado "democrática" é preferível a uma ditadura fascista ou autoritária. Mas a questão é que o Estado é reaccionário por natureza, é sempre uma instância em favor da burguesia. Mesmo numa democracia avançada o Estado ajuda à manutenção da barbárie capitalista. Portanto, aos comunistas compete tomar o poder de Estado e transformar toda a máquina estatal, substituindo-a pela organização dos produtores (claro que só estou a dar um leve esboço sobre a questão). Até porque a democracia, vindo de encontro ao que vinha dizendo, não é uma imanência muito bela que paira sobre a humanidade, mas tem uma natureza de classe. Daí que os comunistas defendam, transitoriamente, a democracia proletária (o proletariado organizado em classe dominante para reprimir a contra-revolução) e, posteriormente, com a extinção, a longo prazo, do Estado e das classes, já não exista mais democracia. Atenção! Eu não estou a dizer que o comunismo não é sinónimo de liberdade. Eu aqui ataco a democracia enquanto uma forma de Estado e não práticas libertadoras (que até poderemos chamar de democráticas para simplificar a coisa) e emancipatórias.
3- eu não disse que todos os problemas sociais sejam redutíveis à classe social. O que digo, e que o marxismo clássico defende, é o primado do económico. Ou você acha que amanhã se, numa hipótese meramente académica, a produção de valor derrocasse o capitalismo sobreviveria. Aliás, a centralidade dada à classe, do ponto de vista teórico, tem consequências políticas de prima importância. Daqui deriva o primado da luta de classes na acção política das organizações de esquerda. Aqui, e volto a repetir o meu anterior comentário, tanto o PC, como o BE ou a RC não são nada claros quanto a isto. Mais, quando propugnam pela luta de classes, fazem-no apenas numa linha economicista, pois nunca assumem a luta política pelo derrube do Estado, a longo prazo. É que substituir o governo do Santana por uma eventual, mas pouco provável, coligação PS-PCP(ou RC)-BE - que até pode ter alguns pontos positivos, apesar de eu duvidar muito - não é o mesmo que lutar por objectivos revolucionários.
Voltando à problemática da intercepção da classe nos restantes campos sociais. Para mim, isso parece-me muito óbvio. O Estado, por exemplo, é um sustentáculo da reprodução da dominação de classe. O Estado não intervem directamente na exploração do trabalho assalariado, mas assegura, através da força e da violência simbólica (as ideologias) a desorganização política e ideológica das classes dominadas. A própria escola não está directamente vinculada à dominação de classe. Mas se não fosse a instituição escolar de que forma o capitalismo teria uma mão-de-obra gradativamente qualificada para poder produzir mais-valia nos sectores produtivos mais ricos em incorporação de capital constante.
Apenas uma ressalva sobre a questão do aborto. Não é por uma questão hegemonizar o discurso da esquerda que passa a ser estruturalmente central na definição da perpetuação de uma formação social capitalista.
4- ver ponto anterior
5- o Partido Europeu da Esquerda padece dos mesmos problemas que a esquerda portuguesa referidos acima.
6- vou dar um exemplo. O sufrágio universal foi imposto, em grande parte, por obra e graça das lutas das classes trabalhadoras. Sem dúvida que é uma conquista civilizacional, mas se esquecermos o objectivo revolucionário e nos enredarmos somente, e sublinho somente, em volta dos direitos civis, políticos ou sociais, a estrada para o reformismo deixa de ter portagens - o caminho está escancarado. Por conseguinte, não faz sentido equiparar a luta pela cidadania à luta política. Pelo contrário, aquela deve subordinar-se à última. Foi isto que aprendi com o Lenine, a Rosa Luxemburg e com o Marx.
7- esta da co-incineração de Souselas vem de encontro com a determinação indirecta da classe sobre os restantes fenómenos sociais. Desde logo, a redução de custos. Só assim se compreende que a incineração de resíduos sólidos seja realizada numa cimenteira próxima de uma população. Se o factor valor de troca não contasse para o totobola a solução seria fazer a co-incineração num local afastado (não sou um expert em questões ambientais, por isso vou partir do princípio que a co-incineração é a melhor solução - até porque não é isso que está aqui em discussão). Por outro lado, muitos daqueles resíduos não existiriam numa sociedade comunista, pela simples razão de que o desenvolvimento das forças produtivas, organizadas num esquema societal não submetido ao imperativo do lucro, seria antagónico com a produção de lixo altamente perigoso. Mas para lá destas considerações um tanto ou quanto futuristas, não devemos pôr de lado a hipótese de que muitos dos materiais usados - que estão na base dos resíduos - só o são porque são mais baratos que outros materiais não poluentes ou num grau inferior. Concluindo, redução de custos com transportes, instalações novas e respectivos acessos, e com determinadas matérias-primas, têm que ver com a produção de valor. A margem de lucro aumenta com a redução dos custos totais. Isto parece-me bastante claro.
Saudações comunistas
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