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Subject: O sobrevivente


Author:
Correia da Fonseca
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Date Posted: 15/05/05 13:23:17

O sobrevivente

No dia em que se festejava o 60º aniversário da derrota do nazifascismo, foi logo de manhãzinha, pouco depois das oito da manhã, que vi na RTP um documentário de origem francesa que seria o de melhor qualidade entre quantos, aliás não muitos, naquele dia nos lembraram a Segunda Guerra Mundial e o seu termo na Europa. Era uma repetição, mas quando os programas o merecem não há nada a objectar a que sejam repetidos. Intitulava-se «Quatro Mulheres na Guerra”, fazia a história sumária do conflito a partir das experiências de cada uma delas e resultava, embora involuntariamente, particularmente revelador do modo como desde há muito nos está a ser contada a Segunda Guerra Mundial: das quatro mulheres de que nos falava o documentário, uma era francesa, outra era inglesa, outra era norte-americana, outra era alemã. Quer dizer: «Quatro Mulheres na Guerra» omitia por completo que também uma mulher soviética, entre milhões delas, teria um percurso pessoal que contribuiria decisivamente para completar uma reconstituição, mesmo forçosamente elíptica, do que foi na Europa a Segunda Guerra Mundial. Como que em compensação, havia a estória de uma mulher alemã. Não tenho a menoríssima dúvida de que também milhares de mulheres alemãs viveram e muitas vezes morreram em clima de tragédia, e não estou a pensar apenas nas lutadoras democráticas que foram das primeiras a entrar nos famigerados campos de concentração e são agora esquecidas porque não eram judias. Mas a inclusão de uma alem ã em aparente substituição de uma soviética sugere uma espécie de inversão de alianças que só parecerá absurda a quem não se tenha dado conta não apenas do que aconteceu nas décadas posteriores a 45 mas também na década que antecedeu a guerra e que tem sido muito mal contada. E a questão é afinal simples: a aliança das democracias do Ocidente com a União Soviética no combate ao Eixo nazifascista foi uma espécie de «partida do destino» pregada aos dirigentes ocidentais, que haviam desejado coisa bem diferente. Quando Winston Churchill falou, já em pleno após-guerra, da «guerra inútil» referindo-se ao conflito de 39-45, sabia do que falava e porque falava assim; e um punhado de factos ocorridos antes de 39 e já durante a guerra confirmam até à evidência que a guerra desejada por ele e por outros como ele era bem outra.

Quando os factos explicam

Também no passado dia 8, mas mais lá para a tarde, a televisão deu-nos a ouvir o incomparável Bush a dizer coisas que confirmam a existência de um espírito de cruzada anti-soviética já existente em Maio de 45: disse ele que foi um erro norte-americano que as tropas USA tivessem «permitido» que o avanço do Exército Vermelho chegasse até Berlim (como se lhes fosse possível impedi-lo, mas essa é outra questão). Mas é um facto histórico, que aliás a TV por várias vezes deixou conhecer, que nos meses finais da guerra a Alemanha fez abundantes transferências de tropas da frente ocidental para a frente Leste a fim de tornais mais fácil o avanço anglo-americano enquanto procurava retardar o avanço soviético. Mais: é também factual e documentado que por essa altura Hitler tentou ainda uma paz separada com a Grã-Bretanha para que a Alemanha ficasse com as mãos livres para destruir a URSS. E, no primeiro semestre de 39, a obstinada recusa do Ocidente, formalmente confirmada pelo testemunho do então embaixador norte-americano em Moscovo, em entender-se com a URSS, como esta desejava, para que em conjunto enfrentasse a já evidente ameaça nazifascista. Foi na sequência dessa repetida recusa, e entendendo o que ela representava de estímulo para que Hitler se aplicasse na destruição do «bolchevismo russo», que a URSS se viu compelida a assinar em óbvia legítima defesa o pacto de não agressão germano-soviético que depois deu origem a distorções do seu sentido, as calúnias, a campanhas ignóbeis de propagadanda que ainda hoje duram, porque o anticomunismo sem escrúpulos nunca dá mostras de cansaço.
Tudo isto e muito mais podia ter sido dito na TV quando deste 60 aniversário; tudo isto e muito mais foi omitido. Mas não foi decerto por acaso que as maiores comemorações da data decorreram em Moscovo, apesar da participação soviética para a vitória ter sido enormemente silenciada. Por mim, reconfortou-me um pouco ver as imagens que o Euronews, que contudo não é propriamente um canal neutro, deu ao desfile na Praça Vermelha numa reportagem relativamente longa. Lá estavam, além dos dirigentes ocidentais a aplaudirem diplomaticamente, os velhos combatentes e alguns não tão velhos, muitas bandeiras vermelhas que a actual Rússia gosta pouco de mostrar e, invisível mas pressentível, a mensagem de que, ao contrário do que supõem os que se sentem senhores do mundo, o futuro não foi inteiramente assassinado, é o mais importante sobrevivente da Segunda Guerra Mundial e de quanto se lhe seguiu, e continua a acenar-nos. Embora não tão perto quanto um dia sonhámos.

in www.avante.pt

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Replies:
Subject Author Date
"não há machado que corte, a raíz ao pensamento"João Luís15/05/05 14:01:21
Dá de facto para pensar em todas as histórias que nos têm contado...Ana Maria15/05/05 14:40:35
Lervelho15/05/05 15:35:04
E as mulheres polacas, checas, húngaras, etc, etc?observador curioso15/05/05 19:31:51


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