Subject: Inintelegível |
Author:
TOLENTINO
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Date Posted: 23:30:41 09/05/02 Thu
In reply to:
Le Monde Diplomatique
's message, "Hipóteses de Reconfiguração das Indústrias do Estado" on 18:13:59 09/05/02 Thu
Fidalgo perora e procura protagonismo, deveria ser o título deste arrazoado ou melhor desta mistura de frases feitas com o intuito de defender de forma absolutamente hermética um determinado conceito de serviço nacional de saúde.
Só que os resultados estão à vista e esses nem Fidalgo nem o Diabo os podem escamotear.
O estado do serviço de saúde em Portugal decorre fundamentalmente de uma total incapacidade dos seus gestores - médicos, administradores hospitalares (vulgo, burocratas) e enfermeiros - todos funcionários públicos, donde todos irresponsáveis, todos achando que o dinheiro dos contribuintes é inesgotável.
A gestão dos serviços públicos de saúde por agentes totalmente ignorantes dos mais elementares conhecimentos de gestão empresarial, conluiados num poderosos lóbi e grupo de pressão, tem os seus dias contados. Quem matou o SNS não foram os capitalistas, foram os profissionais da saúde.
É certo, sejamos justos, que os sucessivos (des)governos deram preciosa ajuda mas a responsabilidade maior é de quem permitiu que fossem os médicos a gerir o sistema hospitalar.
Não existe na sociedade portuguesa classe profissional mais mercenária, mais gulosa por dinheiro e por regalias materiais. E mais "mafiosa" também.
Os múltiplos interesses que a classe dos médicos sempre tem defendido, a sua irresponsabilização profissional, ímpar em toda a Europra - quantos médicos portugueses foram condenados por inépcia ou por negligência nos últimos anos? - e a constituição de um forte grupo de pressão, por vezes a coberto de uma pretensa opção política/ideológica conduziram o SNS ao descalabro.
Descalabro financeiro, descalabro assistencial.
Agora temem as privatizações. E têm razão. Na óptica capitalista quem não produz resultados é impiedosamente afastado. E os nossos paladinos do SNS têm medo que isso lhes aconteça.
Farão greves, virão às televisões bradar que este governo quer matar a saúde, quer favorecer o Champalimaud, que o ministro da saúde pertence ao lóbi dos privados, etc, etc.
Terão porventura alguma razão, mas quem é que permitiu que tal viesse a acontecer? Quem pela sua inépcia, pela sua negligência, pelo seu absentismo, pelo abuso de regalias intoleráveis, permitiu as listas de espera, quem se recusa a ir para fora dos grandes centros urbanos, quem quer ter duplo, triplo emprego, quem quer enriquecer a todo o custo?
Advinhem...
Tolentino
>Hipóteses de Reconfiguração das Indústrias do Estado
>Paulo Fidalgo, médico do Instituto Português de
>Oncologia
>
>Frustrados os desejos de mudança, em Portugal e na
>Europa, a esquerda ensaia, embora com resistências,
>uma reconsideração de estratégias para retomar a
>iniciativa.
>
>Na origem dos avanços da direita, ficou patente, do
>lado da socialdemocracia, a inclinação aos
>compromissos oportunistas. Do lado comunista, embora
>sem aquele doentio pragmatismo, ficou a noção da falta
>dos dispositivos tácticos, estratégicos e de análise
>crítica do capitalismo, que polarizassem o movimento
>popular e compensassem a falta de perspectivas da
>política rosa.
>
>Porventura, o maior imobilismo da base militante
>anticapitalista esteve na sua orientação para o sector
>das indústrias estatais, as quais, apesar do ataque
>liberal-conservador, não cessam de mostrar vantagem
>económica e social, instinto de sobrevivência e
>tendência à expansão. Tenta-se, por isso, dar aqui
>conta de hipóteses de reconfiguração que estimulem a
>preparação de uma alternativa.
>
>Indústrias do Estado: bengala ou rival do capitalismo?
>Historicamente, o sector estatal, nasce como
>expediente externo do capitalismo para o apoiar e lhe
>permitir concentrar melhor nos negócios de elevada
>remuneração do capital. Não é demais citar a tese de
>David Himmelstein formulada a propósito da indústria
>de prestação de cuidados de saúde, mas
>fundamentalmente generalizável a outras indústrias
>estatais:
>
>“o ponto de vista marxista sustenta que o impulso para
>o lucro e a expansão são os determinantes do
>desenvolvimento de qualquer indústria capitalista.
>Contudo, certas indústrias que não seriam viáveis num
>economia pura de mercado capitalista, são necessárias
>à boa operação e rendimento da economia capitalista em
>geral. Em tais casos, o governo, a que aliás Marx se
>referia como o “comité de gestão dos negócios comuns
>da burguesia” pode avançar e assegurar que tais
>prestações sejam erguidas pelo Estado. São exemplos
>vulgares desta estratégia, o sistema de estradas, os
>esgotos, o sistema de educação pública, etc.
>
>A indústria da saúde, por exemplo, facilita o bom
>rendimento do capitalismo porque muitas doenças que
>ameaçam a produtividade da mão de obra podem ser
>curadas ou atenuadas. Citando Charles Eliot, um dos
>presidentes da Harvard Medical School do século XIX:
>“O objectivo da investigação em medicina é prevenir as
>perdas industriais por doença, e mesmo a morte, entres
>os trabalhadores e os animais domésticos”. A indústria
>da saúde é também importante para a manutenção da
>tranquilidade doméstica e a estabilidade social
>necessárias à produção e ao lucro; em termos marxistas
>este é o papel ideológico da medicina.”
>
>Assistir o capitalismo com formações não capitalistas
>constitui, já por si, uma premonição dos seus limites
>históricos. É que, ao dar espaço a uma formação
>económica potencialmente alternativa, porque
>organizada em moldes não capitalistas, e mesmo que
>sujeita ao férreo controlo Estatal, pode ser jogo de
>azar que acabe por questionar o próprio capitalismo.
>Ao flutuar com a correlação de forças, pode o sector
>estatal, pela pressão popular, deslizar dos limites a
>ele impostos. Mesmo em períodos de marasmo histórico,
>a procura crescente dos seus produtos – que compete
>com os apoios ao capitalismo – e mutações tecnológicas
>geradoras de súbitas oportunidades de negócio, podem
>fazer o capitalismo colidir com as indústrias
>estatais.
>
>É natural pois que, na óptica burguesa, o modo de
>produção Estatal não se oriente para acumular riqueza
>, arte dir-se-ia geneticamente reservada a
>capitalistas. O que interessa ao capitalismo é
>garantir tão-só, um output suficiente das indústrias
>estatais, a custos razoáveis! O capitalismo reage
>aliás sempre que sobem os custos da produção pública
>acima de um certo limiar. Compreende-se que se pode
>gerar assim um gradiente inverso ao pretendido: não
>servir a economia estatal a acumulação no sector
>capitalista, mas passar este a “subsidiar” aquela,
>pelo excesso de absorção de recursos.
>
>Por não replicar os estímulos do capitalismo, aparenta
>a economia Estatal menos agilidade. Daí que o seu modo
>de produção e respectiva superestrutura, assentem em
>duas características definidoras: o assalariamento e a
>tutela estatal de contenção da produção nos estreitos
>limites convenientes à boa operação da economia
>capitalista.
>
>Se, porventura, as forças produtivas das indústrias
>estatais progredirem ou as necessidades sociais
>aumentarem, surge então uma grave contradição com o
>assalariamento e com a tutela restritiva do Estado, os
>quais se tornam então em travão ao seu
>desenvolvimento, acabando necessariamente na
>reconfiguração qualitativa do sistema.
>
>É uma evidência que, no que se refere ao Serviço
>Nacional de Saúde, esta é a contradição nuclear que
>opõe, naturalmente, os que apostam na expropriação das
>indústrias do Estado a favor do capitalismo, o que em
>nada favorece o aumento das forças produtivas, em
>oposição aos trabalhadores de saúde, que reclamam mais
>desenvolvimento das forças produtivas, mas jogando em
>relações de produção que libertem o desenvolvimento.
>
>Se, em vez de parente pobre do capitalismo, as
>indústrias do Estado adoptassem um modo de produção
>que estimulasse a sua expansão, permitisse melhor
>situação material aos seus trabalhadores e
>satisfizesse as necessidades sociais, deixaria de ser
>então uma bengala do capitalismo, para se transformar
>no seu contrário: um ameaçador concorrente rumo a uma
>nova economia. Constituiria portanto uma evidência, de
>que pode afinal a economia ser eficiente sem precisar
>de capitalismo para nada.
>
>É portanto no âmago do modo de produção das indústrias
>do Estado, onde pontifica a relação assalariada – e da
>sua superestrutura de tutela – que está a questão
>fulcral a responder e a revolucionar por quem milita
>por um novo mundo. Como foi pela primeira vez afirmado
>há mais de 150 anos , o assalariamento é a expressão
>da mais iníqua opressão da classe trabalhadora, pela
>usurpação do sobreproduto do trabalho e aviltante
>alienação que acarreta.
>
>O modo de produzir em ambiente estatal é o fim da
>história?
>Ao dizer-se que as relações de produção, no
>capitalismo e nas insdústrias estatais a ele
>subordinadas, são de tipo assalariado, estamos a
>afirmar que a mão de obra é fundamentalmente
>remunerada segundo um preço/salário que resulta, de
>acordo com a teoria do valor baseada no trabalho – a
>teoria de Karl Marx, do preço médio dos meios de vida
>necessários à manutenção e reprodução dessa mesma
>força de trabalho.
>
>No processo de valorização do capital, a força de
>trabalho é uma mercadoria ou factor de produção cujo
>valor é achado de forma semelhante aos outros meios de
>produção, combustíveis, maquinaria, etc. Em
>abstratcto, ela vale em média o que custa a criar,
>manter e reproduzir, em termos de vestuário,
>habitação, escola, etc. Daqui decorre, portanto, que a
>remuneração, ajustada para a complexidade do trabalho
>(habilitações, talentos), nada tem que ver com o valor
>da produção realmente efectuada.
>
>Gera tal dissociação o desinteresse do trabalhador
>para com o produto do seu trabalho, quer trabalhe em
>modo capitalista, quer em estatal. Significa isto que
>ninguém encara de bom grado trabalhar de graça para o
>patrão, logo que o valor do salário é alcançado pelo
>valor da produção obtida, nas primeiras horas da
>jornada de trabalho. Se um cardiologista, especialista
>em hemodinâmica cardíada, uma técnica sofisticada de
>medicina, ganha na função pública 2000 euros por mês
>e, se, um cateterismo vale no mercado 1000 euros, com
>uma duração média por exame de 30 minutos, ele vai
>concluir rapidamente que igualou, ao fim do alguns
>cateterismos, o valor do seu salário. Torna-se por
>isso num relutante produtor no resto do tempo a que
>está contratualmente obrigado.
>
>Esta contradição é a chave para compreendermos como o
>comportamento produtivo é influenciado por quem
>controla a riqueza produzida. Para superar esta
>relutância é incontornável assumir-se um dos
>postulados chaves do movimento dos trabalhadores: a
>aspiração à reapropriação da riqueza usurpada pelo
>capitalismo ou pelo seu governo e respectivo braço de
>comando estatal.
>
>Olhando o século XX, podemos dizer que a táctica dos
>trabalhadores tem sido muito recuada, a respeito das
>relações de produção, quer nas economias hegemonizadas
>pelo capitalismo, quer nas experiências socialistas.
>Com a excepção talvez das peculiares relações de
>produção na agricultura (P. Ex: reforma agrária) onde
>se aceitou o controlo laboral da riqueza, a
>industrialização estatal manteve, no essencial, o
>mesmo assalariamento do capitalismo.
>
>Já Louis Althusser esgrimia aliás, contra a
>orientação de Estaline e do PCUS, por estes adoptarem
>o ponto de vista social-democrata, de afunilar no
>chamado crescimento extensivo das forças produtivas,
>congelando ao mesmo tempo as relações de produção, o
>factor dominante na dialéctica de expansão de uma
>formação económica. Tratava-se, pois, de um desvio
>tecnocrático, sustentador de um Estado “esclarecido”,
>face a uma classe operária menorizada na sua missão
>libertadora.
>
>De acordo com a clássica equação de valorização do
>capital , o custo de produção de uma mercadoria (por
>exemplo os cuidados de saúde) difere, para menos, do
>valor com que essa mesma mercadoria é trocada no
>mercado. A razão para essa valorização do capital,
>deve-se a uma parcela, denominada mais-valia, que é
>para muitos misteriosa e que não vamos aqui analisar.
>Em capitalismo, a apropriação da parcela de
>valorização do capital é feita pelo detentor de
>capital, a ela opondo-se o trabalhador.
>
>Se é compreensível o ciclo de valorização mercantil do
>capital, já tal não acontece, com a mesma facilidade,
>quando uma indústria é de tutela estatal e distribui a
>sua produção de forma não mercantil – isto é, não põe
>à venda os seus produtos. A indeterminação do valor em
>ambiente não mercantil, não quer contudo dizer que ele
>não influencie o comportamento de quem trabalha. Esta
>dificuldade de cálculo em ambiente estatal é ilustrada
>pelo orçamento geral do Estado. Sabemos com efeito
>quanto custa hoje o SNS ao país - cerca de 1250
>milhões de contos/ano - mas não sabemos quanto vale
>sua produção anual pois tal informação só seria obtida
>se houvesse venda.
>
>Para responder a esta dificuldade de cálculo imitam-se
>geralmente os preços do mercado capitalista. Contudo,
>nas indústrias estatais, mesmo esta simples imitação é
>muito incipiente, provavelmente porque não se lhes
>atribui vocação para valorizar o capital investido.
>
>A inexistência de réguas de cálculo do valor da
>produção inviabiliza para já a evolução das relações
>de produção e uma aproximação à sua definição
>constitui, portanto, uma prioridade para os
>trabalhadores. Só assim se conseguirá, de resto, ligar
>a remuneração à produção, superar o salário e
>transformar num verdadeiro empreendimento a relutância
>com que os trabalhadores agora encaram a produção.
>
>Serão os preços do mercado uma boa régua do valor?
>A verdade porém é que a forma preço do mercado
>capitalista, desvia-se daquilo a que poderíamos chamar
>o “valor natural” dos bens. Múltiplos factores, como a
>procura ou o carácter inovador de um produto, afastam
>o preço do valor (de troca) e aí reside, de resto,
>parte da anarquia da economia capitalista.
>
>Se as indústrias estatais visam satisfazer
>necessidades de uma forma não mercantil porque se
>conseguirá assim, em princípio, maior racionalidade na
>distribuição, então, perder-se-á essa suposta vantagem
>com a rendição ao preço mercantil. Será no fundo
>deixar as taras do mercado entrarem pelas traseiras
>quando o que procurámos foi livrarmo-nos delas. No
>caso da saúde, certas especialidades médicas seriam
>assim especulativamente hipervalorizadas pois acedem a
>preços mais altos, precisamente pelas tais aberrações
>mercantis. A verdade é que, ao contrário do que dizem
>os seus defensores, o mercado não é uma boa forma de
>medir o valor.
>
>A economia política moderna sempre radicou a origem
>do valor (de troca) nos tempos de trabalho,
>socialmente médios, necessários à produção de um
>determinado bem. Nesta teoria, um grama de ouro
>troca-se por uma tonelada de algodão, porque o tempo
>de trabalho gasto para o extrair nas minas de
>Johannesburgo é, basicamente, o mesmo que o de um
>pelotão de trabalhadores nos campos de algodão da
>Geórgia. A análise abstracta do valor em ambiente não
>mercantil, deverá, em princípio, respeitar este
>postulado básico.
>
>Uma forma portanto de equivaler a uma regra de tempos,
>toda a diversidade de actos praticados nas indústiras
>estatais é a de reduzi-los a tempos médios socialmente
>aceitáveis de execução. Significaria isto que um exame
>hemodinâmico cardíaco valeria 30 minutos de trabalho
>especializado, o mesmo por exemplo que os 30 minutos
>de uma ressecção do apêndice ou o de duas consultas de
>clínica geral. Esta régua servirá para determinar a
>norma de trabalho a negociar para a jornada normal de
>trabalho, permitindo igualar, no fundamental, os
>trabalhadores, independentemente do seu saber.
>
>Podemos portanto imaginar uma dupla remuneração em
>que, para a duração basal da jornada de trabalho, se
>ajustam produções segundo uma tabela de tempos a troco
>de uma remuneração de tipo salarial. Quantifica-se
>deste modo o conteúdo produtivo do tempo de trabalho,
>factor crucial na definição de metas. Caberiam neste
>regime estímulos ao bom cumprimento do contratado.
>Para períodos suplementares de trabalho, onde se
>procurem respostas a necessidades especiais,
>adoptar-se-ia uma imitação de preços mercantis,
>entrando claramente na esfera do sobre-produto. O
>controlo laboral do sobre-produto deveria exprimir-se
>ainda pela autonomia das empresas quanto a saldos de
>exploração.
>
>Rodeada por um ambiente capitalista, deve uma economia
>não mercantil procurar as sua específica valorização.
>Não pode ignorar o mercado capitalista, mas não deve
>render-se totalmente ao seu efeito, uma vez que
>ambiciona uma racionalidade alternativa.
>
>E o socialismo?
>Sem valorização da produção – com base nos preços
>mercantis e/ou nos tempos de trabalho, não é possível,
>como se disse, edificar um novo modo de produção
>motivador de um radical incremento produtivo.
>
>Contudo, novas superestruturas deverão corresponder às
>novas relações de produção onde a reapropriação pelos
>trabalhadores, da parcela valorizada da produção,
>questiona o Estado e o governo. Ao fazê-lo,
>suscitam-se novas prespectivas em relação à transição
>do capitalismo para o socialismo e, logicamente, às
>necessárias mudanças na esfera política, mas que não
>podem aqui ser desenvolvidas.
>
>Ensaiam-se já hoje embrionários assaltos à fortaleza
>do trabalho assalariado como procuraram ser, na saúde,
>o sistema remuneratório experimental da clínica geral
>e os Centros de Responsabilidade e Custo nos hospitais.
>
>Colocar na agenda política a reclamação de novas
>retribuições apontadas a um novo figurino das relações
>de produção é ajudar a edificar um movimento radical
>de reconfiguração das próprias indústrias do Estado,
>não deixando contudo de estar profundamente ancorado
>nos interesses imediatos dos seus trabalhadores e
>ajudar a torná-las numa alavanca de progresso.
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