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Subject: Muito riso, pouco siso?


Author:
Correia da Fonseca
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Date Posted: 24/07/05 19:51:28
In reply to: Paulo Sucena, Público, 23/07/05 's message, "Com imensa amargura" on 23/07/05 15:50:01

Muito riso, pouco siso?

Correia da Fonseca, Avante, 21/07/05

Como toda a gente sabe, o País está numa situação difícil, e dizê-lo assim é utilizar um eufemismo e uma imprecisão.

A imprecisão, de uso generalizado, está em designar por uma palavra apenas, País, uma realidade que está longe de ser homogénea e cuja diversidade interna é tamanha que a tal situação difícil não o é para todos, longe disso, como emblematicamente é demonstrado pelo «boom» de venda de carros de gama altíssima e de outros luxos.

O eufemismo corresponde exactamente à palavra difícil, que se situa abaixo da realidade quando eventualmente aplicada a uma parte da população, designadamente ao número de desempregados que continua a crescer e muitas vezes arrasta tentações suicidárias, e está acima de uma outra realidade que é a do segmento dos que continuam a viver como nababos e que, para garantir a manutenção desse nível de vida, mandam que o povão seja bombardeado com o fogo cruzado da perda de «regalias», ameaças de redução nos serviços que o Estado lhe presta (e que são, afinal, a grande justificação para que exista um Estado civilizado e minimamente democrático) e, segundo algumas vozes cujo número parece tender a alargar-se, «inviabilidade» nacional.

No meio de tudo isto, que é pelo menos inquietante, surgem pérolas como as produzidas por aquele sábio empresário que recomenda a redução em 10% do salário dos trabalhadores e se indigna muito porque os portugueses querem ir para a praia.

As da Costa da Caparica ou da Linha de Cascais, supõe-se, porque as das grandes estâncias mundiais do turismo balnear estão obviamente reservadas aos seus pares, famílias e equiparáveis, e mesmo as do Algarve estão muito longe do alcance de todas as bolsas.

Infelizmente, ao produtor daquela boutade não tenho ideia de alguma vez o ter visto na televisão, e disso tenho muita pena porque acho que seria um convidado excelente do actual Herman José: o homem tem pilhas de humor, embora negro, e percebe-se que por debaixo do verniz inerente à sua condição de membro do «beautiful people» está um sujeito suficientemente reles para o estilo dominante no «Herman Sic».

Rir, mas de quê?

Nestas circunstâncias, entende-se que o actual Caso Português nem é assunto para rir nem suscita um clima propício a hilariedades generalizadas.

Haverá talvez quem pense que sim, que rir é adequado, mas esses são talvez os que acham muito saudável que se vá contando anedotas durante o regresso de um funeral ou mesmo durante um velório, para «combater a tristeza».

Ora, embora a imagem do funeral seja excessiva neste contexto, noto com alguma perplexidade que abundam como nunca na televisão portuguesa os programas empenhados em fazer-nos rir, e por sinal sempre ou quase sempre querendo induzir-nos não a um riso inteligente mas sim, pelo contrário, ao chamado riso parvo.

Alinhando apenas pela ordem em que me ocorrem e sem qualquer outro critério, registo «Os Batanetes», «O Prédio do Vasco», «Levanta-te e ri», «Flagrante Delírio», «Herman Sic», «Camilo em Sarilhos», «Camilo, o Pendura», «Os Malucos do Riso», «K7 Pirata», «Tudo o que Você Quer Saber Sobre...», «Juras de Amor», «Contra-Informação».

Anoto de memória e sabendo que não estou a fazer um arrolamento exaustivo. Mas suficiente para nos perguntamos se esta avalanche, adicionada à sua mediocridade dominante, corresponderá à TV mais adequada ao tempo que vivemos ou terá intenções analgésicas.

Convém dizer, é certo, que também são transmitidos programas graves e sérios acerca da nossa situação actual, sendo o «Prós e Contras» o mais paradigmático do modo como em regra são construídos: com exclusão total de vozes que possam ser alternativas ao discurso oficial e oficioso.

É neles que nos é repetida uma receita simples: é preciso que os trabalhadores se sacrifiquem para que os grandes empresários possam «produzir riqueza», sendo que só após essa produção poderá talvez acontecer que umas migalhas deslizem, enfim, das mesas fartas para as mesas vazias.

Então, segundo Salgueiros, Ulrichs e similares, o País será, enfim viável. Perante isto, é caso para suspeitar de que tantos programas de Humor & Larachas têm por certo que enquanto o cidadão se rir das piadas de preferência reles não estará a reflectir sobre coisas sérias.

E para que os que resistem a esta provável manobra lá estão, como reforço, os iscos cada vez mais frequentes de programas situados nos arredores da TV erótica. Mas essa é uma outra pista que aqui não cabe.

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