| Subject: Re: Descaracterização ideológica |
Author:
Gonçalo Valverde
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Date Posted: 10:54:56 02/03/04 Tue
In reply to:
Guilherme Statter
's message, "Re: Descaracterização ideológica" on 19:53:43 02/02/04 Mon
>Há-de-me esclarecer sobre essa da "teoria da
>multitude".
O Negri e o Michael Hardt fartam-se de falar na multitude no seu livro "Empire", em que referem que será a "multitude" (sim, a palavra existe em português, acabei de ir confirmar ao dicionário :-) ) que irá derrubar o império. Se eu percebi bem (e admito que tive alguma dificuldade na compreensão de algumas partes do livro, talvez por falta de conhecimentos académicos da minha parte), Negri e Hardt substituem o conceito de classe proletária pelo da multitude como sendo o despoletador do derrubar do estado de coisas actual.. Do meu ponto de vista o problema que se coloca nesta visão não é o da substituição da ideia da classe proletária como sendo a classe revolucionária pelo da multitude... o problema é que me parece que esta ideia da multitude é tudo e nada, ficando de tal forma tão indefinida que tudo cabe lá dentro sem nunca se definir exactamente o que é isso da multitude (ver por exemplo o texto de Toni Negri em <a rel=nofollow target=_blank href="http://www.nadir.org/nadir/initiativ/agp/space/multitude.htm">http://www.nadir.org/nadir/initiativ/agp/space/multitude.htm</a> ).
Como se a revolução surgisse por geração espontânea de um caldo em que está tudo misturado...
Não quero aqui entrar por uma defesa do vanguardismo que me parece facilmente descambar no elitismo revolucionário, mas do que compreendi desta ideia da "multitude" fica-se com a ideia que a transformação (não se sabe muito bem para o quê) surgirá automagicamente da "multitude"...
Ora parece-me ser nesse caminho que avançam os Foruns Sociais Mundiais ou mesmo este anunciado Partido de Esquerda Europeu, que parece ser um Bloco de Esquerda a nível Europeu. E qual é o problema com um Bloco de Esquerda Europeu? Nada se estivessemos a falar de uma coligação, no entanto enquanto partido acaba por se cair no problema de se preocupar apenas com algumas causas (era o próprio BE que se afirmava ser um partido de causas) e esquecendo a base da coisa, ou seja a transformação social e a superação do capitalismo..
Como é que essa superação poderá ser feita? Bem, ai admito que não sei, e de facto é discutível que venha para aqui criticar o que os outros fazem sem apresentar soluções... mas não me parece que seja por este caminho que se vá lá.. Assim acabamos por cair no politicamente-correcto (aliás, um exemplo claro de que o BE está a ficar presa dessa questão é esse neologismo que utilizam do "tod@s", que também já vi ser utilizado por elementos da ATTAC)
>Quanto ao resto, parece-me evidente que não nos
>podemos ficar pelo espontaneísmo. Estou a pensar em
>"espentaneísmo" no sentido de "não-vale-a-pena-a-gente
>incomodar-se
>muito-porque-a-revolução-vai-à-mesma-acontecer". Claro
>que só acontece aquilo que as pessoas fazem acontecer.
O problema é que me parece que estes movimentos giram muito á volta dessa ideia de que a revolução irá acontecer automágicamente.
>Agora não me parece que se possa esperar desses
>movimentos sociais (como os que vão levando à
>realização dos FSM e Forum social europeu e encontros
>de...) a mesma estrutura e coerência ieológica de um
>Partido.
Parece-me que o problema é muitos estão exactamente á espera que isso aconteça e e encaram esses mesmos fóruns como sendo a solução para ultrapassar a crise dos partidos de esquerda e que saia dai a solução para a mesma esquerda.. ora não me parece que isso vá acontecer, e embora me pareçam importantes a realização dos fóruns bem como dos movimentos sociais, parece-me também importante o reconhecimento das suas limitações
>O que às vezes sou levado a suspeitar é que, nessa
>espécie de desilusão por não haver no FSM a mesma
>estrutura e cosistência ideológica que há num Partido,
>também haverá algumas saudades dos bons velhos tempos
>dos "congressos mundiais da juventude" organizados e
>muito bem estruturados pelo PCUS. "No pun intended",
>como dizem os Ingleses. Ou, sem piada, em vernáculo.
Mas eu não procuro essa consistência ideológica no FSM... e sinceramente nunca gostei muito da ideia dos congressos mundiais da juventude (aliás, indo ainda mais longe, nem sequer gostei da ideia dos pioneiros).
Agora o que me parece ser importante é não nos deslumbrarmos com os FSM e pensarmos que os mesmos serão a solução para a crise da esquerda e que não precisamos de nos preocupar mais em procurar e aprofundar a parte ideológica.. ora é exactamente isso que me parece estar a acontecer aqui na questão do Partido Europeu de Esquerda. Parece-me aliás que neste contexto faria mais sentido apostar-se numa coligação do que num partido)
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